De alguma forma o enigma pode nos alertar |
É preciso prestar atenção e entender o que
não deciframos com a razão
Uma cena chamou a minha atenção hoje pela manhã
quando seguia para o meu compromisso. O olhar de uma senhora diante de uma
vitrine, decorada com enfeites de Natal, foi à alavanca para interromper a pressa.
Parei intrigado.
Ela, a mulher, ali parada, era como se voltasse em algum ponto
da sua história de vida. Os dedos das mãos simples tocaram carinhosamente o
vidro da loja e ela sorriu.
Fui surpreendido quando me olhou com expressão que
traduzia a trajetória de uma vida inteira. A senhora de olhar sereno sorriu para
mim e, claro, retribui constrangido. Afinal, indelicadamente parei para
observá-la!
-O Natal está chegando, até parece que foi outro dia
que ganhei um abraço do meu neto! – disse a mulher com o olhar fixo na vitrine.
Ela sabia que eu a observada.
- Onde está o seu neto? – indaguei-a.
- Ele ficou no Natal. É lá que ele está e mal posso
esperar pelo Natal para poder reencontra-lo! – a resposta da senhora me deixou
confuso.
Como assim, o neto ficara no Natal? Acredite leitor
do BLOG, fiquei com cara de idiota tentando assimilar o que não conseguir compreender
naquele momento.
-O nome dele é Eduardo, tem cinco anos. É um menino
muito bonito – continuou a mulher enquanto permaneci paralisado diante do
enigma.
- O senhor pode vim ver uma coisa? – indagou a
mulher, apontando para a vitrine. Obedeci e me aproximei curioso, embora
reticente.
- O senhor consegue enxergar? Consegue ver o meu
neto, ele está bem ali! – a mulher sorriu, senti calafrio.
Olhei para dentro da vitrine e vi a imagem do Papai
Noel segurando uma estrela, cercado de bolas de Natal coloridas. O meu olhar
fixou naquela imagem, mas permaneci em
silencio.
-Não consigo ver o seu neto, senhora, me desculpa! –
disse lamentando, diante daquele olhar enigmático, agora mirando os meus olhos.
- Podemos enxergar todas as coisas, senhor, até
mesmo as pessoas que mais amamos! Basta enxergar com o coração e tudo se torna
possível! – retrucou à senhora, voltando o olhar para a vitrine.
-O que o senhor gostaria de ver? – indagou-me a mulher, mas não tive resposta.
Estava confuso, tentando entender a forma como as
coisas aconteciam, do inesperado.
Eu, parado, diante de uma vitrine com
enfeites de Natal, ao lado de uma senhora que nunca vi antes. Imagine a cena,
foi real, estranha, e não se trata de ficção.
Senti um aperto no coração quando as palavras
daquela mulher invadiram a minha alma. Perdi a respiração, sem exagero!
- Pensa na sua mãe, ela está ali, no Natal, junto do
meu neto!
Lembrei-me dos tempos de menino, escondido atrás do
sofá da sala, observando minha mãe preparar a mesa para a ceia de Natal. Pude
sentir o cheiro do assado que invadia a casa inteira.
- As nossas lembranças, doces lembranças, estão
entrelaçadas aos instantes importantes de nossas vidas, e continuam acesas,
vivas como chamas! – disse a mulher sorrindo, se afastando. Indo embora.
Continuei estático diante da vitrine, enquanto que a senhora
se afastava. Quis chama-la, perguntar quem era, mas não conseguia me mover. Olhei para a vitrine e vi a minha mãe arrumando a mesa da ceia de Natal. Incrível, ela
estava bem ali, diante dos meus olhos.
As lembranças tornaram-se vivas, e evidentes! Basta
enxergar com o coração! Olhei o relógio e lembrei-me do meu compromisso. Não, eu não poderia me atrasar!
Walther Alvarenga
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